A revista «Veja», porta-voz dos setores mais atrasados das elites brasileiras, não importa que estejam vestidos segundo os cânones da moda politicamente correta, depois de imputar ao MST o crime de educar seus militantes e promover revolução com «lápis e caderno», trata, nesta semana, da objetividade do eleitorado brasileiro. Vai desde pesquisas para medir essa […]
A revista «Veja», porta-voz dos setores mais atrasados das elites brasileiras, não importa que estejam vestidos segundo os cânones da moda politicamente correta, depois de imputar ao MST o crime de educar seus militantes e promover revolução com «lápis e caderno», trata, nesta semana, da objetividade do eleitorado brasileiro.
Vai desde pesquisas para medir essa suposta objetividade, feitas para a própria publicação, a quadros revelados noutros levantamentos, bem como análise de estudiosos do comportamento do eleitor.
Se «Veja» trouxer receita de pudim na capa, algum propósito, é por aí essa conversa de objetivo, estará por trás. Não dá ponto sem nó como afirma o velho ditado, nem publica nada que não represente o ponto de vista mais jurássico dos principais acionistas do Estado brasileiro. No caso da revista, os donos do governo de São Paulo.
«Veja» é tucana do princípio ao fim. E não existe nenhum partido brasileiro tão à direita como o PSDB. É o partido de FHC, de José Serra, de Geraldo Alckimin, de Tasso Jereissati e outros menos votados. Nem o PFL. Há uma diferença entre os dois: os tucanos aprenderam a vestir pele de cordeiro e a posarem de competentes, justo pelo milagre da comunicação. O PFL continua no tempo do tacape e da borduna.
A própria linguagem jornalística da revista é tucana. Vai lá, vem cá, recheia por ali, dá uma, dá duas voltas, três se for preciso e, no final, tacape e borduna chegam com desenho de estilistas famosos, arrebentam com direito a coluna social, terminam em Comandatuba, terra dos «256 homens e mulheres mais importantes do Brasil».
O décimo morador de rua atacado em São Paulo, capital, está morto segundo algumas agências, em estado grave segundo outras. De qualquer forma é o décimo morador de rua atacado. A Polícia não tem pistas, nem tem a menor idéia do que possa estar acontecendo. É responsabilidade do governo estadual, que é tucano.
Desde o primeiro ataque, há cerca de um mês, fatos semelhantes já aconteceram em Belo Horizonte e em Salvador.
Uma pesquisa do Instituto Data Folha, ligado ao jornal «Folha de São Paulo», mostra que José Maluf Serra ultrapassou a petista Marta Favre. A cidade vive um dilema nessas eleições municipais: votar em quem? Serra estava alguns pontos atrás na pesquisa anterior, embora em todas as simulações vença no segundo turno.
Marta, se perder as eleições, a lógica manda dizer que vai perder, mesmo que em tese o quadro possa ser modificado, perde para si própria e seu partido, o afã de ser um PSDB do B.
A matéria publicada em «Veja» sobre essa objetividade do eleitorado brasileiro embute o ideário tucano. Ignora, é deliberado, a importância do debate político e concentra a tal qualidade do eleitor em escolhas que mantêm o processo intacto, sem qualquer perspectiva de mudança.
É a linguagem tucana: você pensa que é uma coisa, vai ver, às vezes muito tarde, como nos oito anos de FHC, que é outra completamente diferente, até pela história do partido. Uma trajetória de oportunismo e corrupção.
A declaração da prefeita no estilo Regina Duarte («eu tenho muito medo do Lula»), dando como certa uma crise política na hipótese da vitória de Serra subestima o eleitor fora do contexto objetivo definido em «Veja» e deve ter sido conselho de marqueteiro maluco, perdido, quando percebe que sua marca de sabão em pó não está tirando manchas e nem lavando toneladas de roupas em tempo recorde.
A matéria de «Veja» abre um fosso para o enterro da prefeita, tenta esticar esse fosso a Recife, Belo Horizonte e Porto Alegre (deve vir coisa mais à frente, o trabalho é sistemático), por mais inocente que pareça, até quando decreta a morte política de Paulo Serra Maluf, principal aliado de Marta (Já foram aliados, «Veja» e Maluf).
A tal objetividade lembra a velha história do direito de votar em quem quiser desde que vote na Mariazinha. Foi aperfeiçoada pelas elites a um ponto tal que é possível votar em qualquer um, ou uma, que continua tudo como sempre esteve, sem qualquer chance ou perspectiva de mudanças. Não há necessidade de obrigar ninguém a votar na Mariazinha, quase todos têm o perfil da Mariazinha.
Eleições, sob o enfoque dado pela revista «Veja», com o perfil traçado e chamado de objetivo do eleitor brasileiro, não representam nada. São a farsa democrática com direito a toda a sorte de espetáculo.
O que não significa que a vitória de determinados candidatos não possa trazer avanços na luta popular. Mas, com toda a certeza, esses nem passam perto de Serra ou Marta.
A única crise que uma eventual eleição de José Serra vai trazer é a do desemprego para a atual prefeita. Dura pouco. Lula logo arranja um cargo na reforma ministerial de fim de ano, ou princípio do outro.
Já São Paulo, com a objetividade do eleitor brasileiro, vai continuar sem pistas no caso dos moradores de rua atacados e assassinados.
E com um detalhe: o pouco espanto, ou a mínima indignação causada pela violência contra esses cidadãos é o resultado de um pertinaz e constante trabalho, bem objetivo, de veículos de comunicação como «Veja». Você chora um rio de lágrimas, um mar, com o drama da novela, ou exibe consciência à hora do voto e os caras continuam arrebentando com bem mais que os moradores de rua: o Brasil e os trabalhadores.