Todos os dias governantes, economistas, juristas, parlamentares e jornalistas vêm a público repetir continuamente que, apesar dos constantes aumentos dos impostos e redução dos direitos trabalhistas, não há recursos para aumentar os valores do salário mínimo e da aposentadoria dos operários, para investir na saúde, educação e saneamento e para acabar com a miséria, mendicância, […]
Todos os dias governantes, economistas, juristas, parlamentares e jornalistas vêm a público repetir continuamente que, apesar dos constantes aumentos dos impostos e redução dos direitos trabalhistas, não há recursos para aumentar os valores do salário mínimo e da aposentadoria dos operários, para investir na saúde, educação e saneamento e para acabar com a miséria, mendicância, desemprego e superexploração dos que trabalham honestamente. Reforma-se a previdência e os tributos e desregulamenta-se as leis trabalhistas, mas a velha e nova burguesia continuam falando da impossibilidade de melhorar as condições de trabalho e de existência da classe operária.
Sob os princípios do liberalismo e democracia burguês, nunca foi, nem nunca será, possível atender a demanda da classe operaria. O roubo ao dinheiro dos investimentos sociais, por um lado, atingem cifras astronômicas. Segundo estimativas de especialistas na área de tributos, presidentes, ministros, governadores, prefeitos, secretários, senadores, deputados, vereadores e assessores desviam entre 150 a 200 bilhões de reais por ano dos cofres públicos. Para o procurador Luiz Carlos Ziomkowski, cerca de 20 a 30% do arrecadado sob a forma de tributos é consumido pela máquina da corrupção. É dinheiro desviado por superfaturamento de precatórios, contratos, obras (projetos que levam vários anos para ser concluídos ou mesmo que sequer saem do papel), produtos destinados à merenda escolar, saúde pública, custos da máquina, consultorias, por cobrança de propinas, etc. e tal.
O destino deste dinheiro roubado é a compra de bens, em nome de laranjas, ou a sua conversão em dólares (lavagem de dinheiro) para serem depositados em contas bancárias nos paraísos fiscais (evasão de capitais). Segundo cálculos do Ministério Público, o esquema montado por Paulo Maluf e Celso Pitta na prefeitura de São Paulo foi responsável pelo desvio de cerca de 30 bilhões de reais (valor atualizado) em 8 anos de administração (1993-2000). No mesmo período, todas as demais prefeituras do Estado de São Paulo, ainda segundo o MP, tiveram seus cofres furtados em cerca de 28 bilhões de reais. A CPI do Banestado, por exemplo, que investigou a roubalheira das prefeituras e governos dos estados do sul e sudeste do país, tomou conhecimento de um esquema de desvio de pelo 50 bilhões de reais. A CPI dos Precatórios, por sua vez, descobriu que o esquema montado em várias prefeituras e estados da região do nordeste foi responsável pelo desvio de pelo menos de 5 bilhões de reais. A art e do roubo da Conexão Nordeste, como ficou conhecido o esquema, foi ensinada diretamente pelos técnicos malufistas de São Paulo.
Os esquemas descobertos pelos MP, CPI’s, TCU’s (Tribunal de Contas) são tantos que é impossível descrevê-los aqui. PC Farias, caixa de Fernando Collor de Melo, dizia abertamente que existia «um Brasil aqui e outro lá fora», isto é, existe tanto dinheiro ilegal lá fora quando o que circula aqui, o equivalente a 200 bilhões de dólares. Mas a evasão de capitais não existe só com o roubo dos cofres públicos. A partir de um estudo realizado nas contas públicas, o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) chegou a conclusão de que empresários, banqueiros, comerciantes e latifundiários deixam de pagar 226,5 bilhões de reais por ano aos cofres públicos. Segundo o IBPT, se não fosse a sonegação e a inadimplência dos donos do capital, a carga tributária no país seria de 51,5% a 53% do PIB (Produto Interno Bruto). Mas, chegaram aos cofres públicos apenas 36,5% em 2002, ou 482 bilhões, e 38,5% em 2003, ou 753 bilhõe s.
A burguesia vive falando pelos quatro cantos do país que as elevadíssimas taxas de sonegação é devido à grande pirataria e aos setores informais da economia. Isso é mais uma grande farsa da burguesia. Para o IBPT, a economia formal deixa de pagar sozinha, ou melhor, de transferir, uma vez que os impostos são pagos pelo comprador no ato da compra da mercadoria ou do pagamento de uma conta (luz, telefone, empréstimo, etc.), ao governo cerca de 150 bilhões de reais ao ano. A indústria mete a mão em 26,31%, o comércio, 29,2%, e o setor de serviços, entre estes os banqueiros, em 25,93% dos impostos devidos.
Os impostos mais sonegados são precisamente os relacionados aos direitos trabalhistas. O estudo do IBPT também nos mostra que mais da metade (51,02%) do dinheiro do INSS e do FGTS não são repassados pelos donos do capital. É como se os patrões transferissem só a parte que pagamos (aquele descontado em folha de pagamento) aos cofres públicos e a sua cota parte fossem totalmente desviados para o seu enriquecimento pessoal. Aí sim está a principal fonte de rombo da previdência social! Mas, existe casos ainda mais gritantes de roubo de direitos trabalhistas. É o caso das empresas de ônibus da capital paulista. Há vários anos elas não transferem nenhum centavo ao FGTS. Um ex-diretor do sindicato da categoria, assassinado recentemente, denunciou como funcionava o esquema entre o sindicato e os patrões. A diretoria do sindicato recebia milhões de reais para não denunciar o desvio de bilhões de reais por ano do fundo de garantia da categoria para o enriquecimento dos patrões.
O governo de ontem e de hoje não estão nem aí com os bilhões da sonegação. Um dos últimos atos do governo de Fernando Henrique, por exemplo, foi assinar um decreto isentando 60 bancos, entre eles, os maiores banqueiros do país (Bradesco, Itaú, Unibanco etc.), de pagar uma multa de 5 bilhões de reais por não apresentarem a declaração dos respectivos saldos do FGTS do fundo na época dos planos Verão (1989) e Collor (1990). O atual governo estima que os banqueiros estão dando um calote de mais de 40 bilhões de reais no caixa da Previdência Social. Segundo o ex-ministro do Trabalho Jacques Wagner, do primeiro ano do governo Lula, não há «meios jurídicos» para desarquivar o processo e fazer cumprir as multas contra os banqueiros. No entanto, naquele ano (2003) o presidente Lula passou o salário mínimo para R$ 240,00 sob o argumento de que um reajuste maior quebraria a Previdência…
Segundo ainda o estudo do IBPT, enquanto o total de arrecadação do governo subiu 2% do PIB (de 36,5% em 2002 para 38,5% em 2003), a participação dos tributos repassados pela burguesia como um todo reduziu em 2,2%. Como a sonegação da burguesia aumenta ano após ano, como a corrupção dos representantes da burguesia aumenta de ano em ano, como a isenção fiscal para atrair capital estrangeiro diminui a receita pública e como o governo precisa incessantemente fazer caixa para pagar as dívidas interna e externa, a fórmula mágica dos liberais e democratas-burgueses é o corte dos direitos trabalhistas e o aumento da carga tributaria sobre a mesma classe operária. Não se pode cortar os direitos de todos e cobrar mais impostos de todos ao mesmo tempo. Como se viu, quanto mais se cobra impostos da classe burguesa mais ela sonega. Os impostos cobrados da classe operaria, ao contrario, são retidos antes mesmo do pagamento do salário e no momento do ato da compra de uma mercadoria ou do p agamento de uma conta, independente da vontade ou do conhecimento do operário. Essa é mágica do liberalismo: passamos nos operários a pagar mais 4,4% de impostos para recebermos menos serviços.
Além de perdemos direitos históricos com as reformas e de sofremos nos últimos anos um forte arrocho salarial, pagamos 64 bilhões de reais a mais de impostos no ano passado ao governo. Apesar dos avanços técnicos da produção e da computação, o Estado democrático-burguês continua sendo uma máquina burocrática demasiadamente pesada à classe operária. Uma máquina liberal que pouco faz contra a sonegação de uma classe, a burguesa, que enriquece sem nada produzir. Uma máquina liberal que pouco faz contra a corrupção de altos funcionários públicos, que também se enriquecem sem nada produzir. Uma máquina democrática que praticamente nada faz para melhorar a situação da classe produtora, a operária. Uma máquina democrática que só serve ao pagamento das dividas interna e externa. Uma máquina democrática que existe para cobrar tributos e sacrifícios de uma única classe, a operária. Um aparato estatal que não tem a nossa cara e não nos serve.
Nº 373, de 05 a 20 de julho de 2004