Deu a lógica na eleição presidencial nos Estados Unidos. Bush é a lógica do império. A prepotência, o terror, a corrupção, os interesses de elites texanas (o Texas e o que gravita à sua volta). A lógica da farsa e da fraude. Várias análises e explicações podem ser encontradas. A professora brasileira Janet Sternberg, da […]
Deu a lógica na eleição presidencial nos Estados Unidos. Bush é a lógica do império. A prepotência, o terror, a corrupção, os interesses de elites texanas (o Texas e o que gravita à sua volta). A lógica da farsa e da fraude.
Várias análises e explicações podem ser encontradas. A professora brasileira Janet Sternberg, da Universidade Fordham, por exemplo, atribuiu o alto índice de comparecimento do eleitorado à Internet. Segundo ela o voto ganhou um conteúdo de apelo pessoal, do vizinho, do amigo, tanto pela rede mundial de computadores, como via telefone celular. A professora, nem entro nesse mérito, disse mais: que no futuro as eleições sofrerão maior influência desse tipo de campanha, em detrimento dos chamados grandes veículos de comunicação de massas.
Isso não explica, entretanto, a vitória de Bush. Muito menos o fato de 52% dos norte-americanos, segundo pesquisas de lá, reprovarem o governo de Bush.
O que, juízo pessoal, é preciso entender, vem do que costumam chamar de «Raízes da América, como se a América fosse os Estados Unidos. É assim que pensam, é nessa direção que agem e os votos refletem essa convicção.
Em primeiro lugar os Estados Unidos são uma federação. Constituíram-se como tal e o sentido federalista é exacerbado no País. A federação norte-americana foi pensada e imaginada por uma elite de fundamentalistas do protestantismo. Guarda todo o reacionarismo puritano de Martim Lutero e Ítalo Calvino, primeiros codificadores do messianismo capitalista.
Os principais jornais do mundo, redes de tevê, mostraram hoje um cidadão de Taiwan num cercado de leões, desvairado, gritando às feras «Jesus vai te salvar». Foi salvo pelos funcionários do zoológico quanto atacado pelo leão macho.
Não existe uma legislação eleitoral única para todo o processo de escolha do presidente da República e o Colégio Eleitoral foi a maneira encontrada pela elite para garantir que nada mudasse, daí o bi-partidarismo, o faz de conta que um é um e outro é outro. São iguais.
Cada estado determina o processo de votação e pode, esse o pulo do gato, excluir eleitores. Foram várias as denúncias de eleitores negros não incluídos nas listas de inscritos. Isso faz com que, ao contrário do princípio democrático de um cidadão um voto, votem apenas os que não oferecem riscos à Federação e aos interesses dos que controlam os EUA. Verdadeiras batalhas judiciais precedem às eleições, todas, para a inscrição de eleitores.
A primeira eleição de Bush, quando perdeu nos votos populares e ganhou no Colégio Eleitoral, se deveu à fraude escancarada na Flórida, governada por seu irmão Jeb e confirmada pela Corte Suprema, hoje uma câmara judiciária com maioria republicana.
Esse sistema lembra as antigas eleições brasileiras, chamadas de «bico de pena», quando eleitores brancos, com alguma renda significativa, de um modo geral comerciantes, industriais, latifundiários, colocavam nas listas com suas próprias letras, os nomes dos candidatos que queriam eleger. Os que não pertenciam às classes dominantes eram empregados inscritos pelos patrões. O sistema de voto aberto impedia a «traição».
Bush tinha consciência que uma nova crise provocada por uma votação apertada e suspeita, resultaria em mergulhar o país num racha de proporções imprevisíveis, com riscos para o seu segundo mandato.
Começou antes a complicar o sistema. As listas de eleitores nos estados chaves. Os votos provisórios, separados, antecipados, posteriores, toda a sorte de trapaças bem montadas e capazes de afastar denúncias.
Foram três milhões de votos à frente do senador Kerry no voto popular. Tenho escrito sistematicamente que por mais que pesquisas e indicativos falassem no crescimento de Kerry, sua condição de bom de chegada não garantia coisa alguma num sistema podre e controlado por chefes políticos estaduais, a maioria de republicanos. Sem falar nas dificuldades do senador, um aristocrata de Massachussetts, o oposto do cidadão médio do seu país que acredita, piamente, no Superman.
O cristianismo fundamentalista nos Estados Unidos se constrói no deus próprio, dissimulado, mas introjetado em cada americano. O Superman. O herói assexuado, puro, incapaz de um pensamento pecaminoso, com devoção total à causa e que, nos momentos difíceis sempre recoloca ou coloca a bandeira no topo da Casa Branca ou em qualquer lugar do mundo. A resposta da arrogância e da prepotência do império a Alá e a Cristo. E a quantos mais existirem ou aparecerem.
Bush só fez exacerbar todo esse processo. Trazê-lo à tona, na medida de sua ambição, por conta dos interesses que representa. Tirou a sujeira escondida sob o tapete e trouxe para a porta da sala. Dessa vez com incrível competência, afinal bandidos de alto coturno costumam ser de grande eficiência na consecução de seus projetos.
A sociedade americana, em termos históricos e em prazo médio, vai começar a perceber que desmorona, paradoxalmente no momento de maior poder, quase absoluto, o esse arcabouço montado pelos pais da pátria para perpetuar o poder em torno do peru no dia de ação de graças.
Os Estados Unidos têm um problema: Bush representa a outra face da moeda do fundamentalismo islâmico: o fundamentalismo cristão/judaico, com a entronização do Superman (era preciso e é preciso, um deus norte-americano para dar consistência tudo isso) nos altares das igrejas e lares dos «pais dos nossos rapazes».
É um sintoma, até porque Bush é uma patologia, de decadência do império. Nada de fatalismo determinista, nada disso. O curso natural da História.
A reeleição de Bush, em linhas gerais, nos limites de um artigo, pode ser vista assim.
Por outro lado, a luta contra o império do terror de mercado.
Existem alvos pré-traçados pelo terrorista confirmado na Casa Branca. A Coréia do Norte, o Irã e, em nossas redondezas, a crescente transformação da Colômbia em base militar dos EUA. Chávez e a revolução cubana são os alvos prioritários.
Outros não menos importantes, mas correndo no contexto dos maiores. A ALCA, por exemplo. Ou o controle do processo de purificação do urânio pelo Brasil.
Ou a sujeição da Europa (controla a Itália e a Grã Bretanha, são estados associados).
Os sonhos de Bush são de um império eterno, onde o sol não se ponha e onde os tacões nazistas reflitam o poder do Superman. São sonhos delírios.
Vai ser preciso repensar todo o conjunto da luta dos povos livres e dos movimentos organizados para os próximos quatro anos.
Se, como eu disse, paradoxalmente, é um momento de início de um declínio, é exatamente onde a besta começa a se mostrar mais besta.
O controle do petróleo, da água, do comércio, de tudo quanto signifique e aumente o poder de Roma/Washington. Como Roma, os EUA tiveram seus césares.
Uns com percepção histórica correta do ponto de vista do imperialismo, outros como Bush, versões contemporâneas de Calígula, e Nero.
A reeleição de Bush é só isso. Um instante da luta de classes, num aspecto maior e num contexto mais amplo, onde a ameaça vem das bombas divinas do império e de tresloucados como o presidente, ou homens de negócio como Chaney. Ou intérpretes de instintos como Condolezza Rice. Foi por isso que outro deles, Donald Rumsfeld chamou a operação contra o Iraque e o povo iraquiano de «choque e pavor». E Israel chama de «dias de penitência» a matança de palestinos.
Ganhou o terror e quem se der ao trabalho de ler o discurso de bin Laden, distribuído às vésperas das eleições nos EUA, vai perceber que o saudita tem um mínimo de equilíbrio. Bush não tem nenhum.