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De Pérez Jiménez a Hugo Chávez, passando por Lúcia Gutierrez

Fuentes: Rebelión

Lúcia Gutierrez é uma bela mulher. Inteligente, bem nascida como costumam dizer os cronistas sociais, passou a vida inteira garimpando ofertórios. Montou talvez a mais importante coleção dessas peças em todo o mundo. Notável, diga-se de passagem. Lucia Gutierrez ganhou de presente (e pagou, essas coisas são pagas, direta ou indiretamente) tratamento de benfeitora e […]

Lúcia Gutierrez é uma bela mulher. Inteligente, bem nascida como costumam dizer os cronistas sociais, passou a vida inteira garimpando ofertórios. Montou talvez a mais importante coleção dessas peças em todo o mundo. Notável, diga-se de passagem.

Lucia Gutierrez ganhou de presente (e pagou, essas coisas são pagas, direta ou indiretamente) tratamento de benfeitora e mecenas num caderno dedicado a que tais no Jornal do Brasil. Benfeitora e mecenas das artes. Vai daí, que no retrato para destacar a senhora em epígrafe, a dita aparece vestindo algo que sugere ser um lingerie e com parte das pernas de fora, em pose algo fatalista, ou tipo mulher fatal.

Para quê? Belíssimas não há o que discutir. Mostrar por exemplo que mulheres com mais de 60 podem ter pernas bonitas? Bobagem. Marlene Dietrich já havia provado isso. Cid Charisse também.

Benfeitores têm essas manias.

Marco Pérez Jiménez foi «benfeitor» da Venezuela por longos 10 anos. Encheu os cárceres de adversários políticos, milhares de venezuelanos se exilaram pelo mundo e, lógico, que ninguém é de ferro, encheu as burras de dinheiro. Nessa época, foi ditador de 1948 a 1959, o dinheiro ia para os bancos suíços.

Pérez Jiménez foi apoiado pelos Estados Unidos.

A chamada moderna democracia venezuelana nasceu com a eleição de Rômulo Bettancourt, adversário do ditador, liberal clássico e que esteve por muitos anos exilado nos EUA. Foi eleito com o beneplácito do governo de Washington, no velho esquema de dar os anéis, no caso Jiménez, para salvar os dedos, falo do petróleo.

De Bettancourt até Rafael Caldera a Venezuela sofreu um processo comum aos países sul-americanos: as elites ficaram cada vez mais poderosas, detentoras da renda nacional em níveis escorchantes, enquanto os trabalhadores viviam à míngua.

A corrupção dos donos do poder foi a regra geral e um presidente, Carlos André Pérez, chegou a ir preso tamanho o apetite com que se lançou na busca de milhões de dólares, a essa altura, já para paraísos fiscais diferentes da Suíça.

Todos os presidentes venezuelanos foram apoiados pelos norte-americanos. O petróleo continuou debaixo dos olhos dos cowboys.

A eleição de Hugo Chávez foi a conseqüência da desintegração nacional e de um estado pré-revolucionário. O país estava à beira do caos e o coronel que havia tentado um golpe de estado chegou ao poder pelas urnas. Duas vezes.

A primeira delas sob a égide do Estado constituído nos moldes traçados pelas elites e com o beneplácito dos donos do mundo.

A segunda, depois de ter dito ao seu povo que não era possível mudar se não fossem mudadas a constituição e as leis que protegiam e mantinham intacto o poder das classes dominantes.

O petróleo começou a se transformar em riqueza do povo da Venezuela.

Chávez foi novamente eleito com o advento de outra constituição. Ou seja: eleito em condições normais, submeteu-se ao sufrágio universal num momento em que iniciava um processo de profundas mudanças na estrutura política, econômica e social de seu país.

Por mais que isso crie uma situação cheia de dedos, como se costuma dizer, existem trabalhadores privilegiados no capitalismo. É um jeito dos donos criarem uma situação dúbia, difícil para o movimento operário. No caso da Venezuela, boa parte dos trabalhadores da estatal petrolífera se opôs a Chávez quando da primeira tentativa de golpe contra o presidente.

Deposto por dois dias, Chávez voltou ao governo por força de um movimento popular.

No Brasil, por exemplo, metalúrgicos do ABCD paulista, em sua grande maioria, foram cooptados pela indústria automobilística e só agora, quando as montadoras voam para outros estados, como conseqüência de incentivos fiscais, e chance de pagarem salários mais baixos, é que percebem que caíram num logro.

Chávez está proporcionando o acesso a todos os venezuelanos à escola, a saúde pública de boa qualidade e gratuita, a medicamentos. Está promovendo a reforma agrária, editou a lei dos hidrocarburetos que assegura ao país o controle de sua maior riqueza e exporta petróleo para Cuba. Mantém estreitas relações com o governo revolucionário do presidente Fidel Castro.

Ele e Castro são os alvos preferenciais de Bush, ou de qualquer presidente, em qualquer tempo nessas circunstâncias, na velha prática dos Estados Unidos de financiar golpes quando seus interesses são contrariados.

O referendo do dia 15 de agosto assume importância para toda a América Latina.

A análise do Departamento de Estado e que tem circulado em parte da imprensa norte-americana é que a vitória do presidente bolivariano pode funcionar como efeito dominó, no caso dos governos corruptos da Bolívia, da Colômbia (possessão dos EUA na América do Sul), do Equador e do Peru.

Há temores que a ressurreição do ministro José Dirceu, no Brasil, possa também vir a desembocar em mudanças na política econômica, no justo momento que Lula sentir que a popularidade está caindo continuamente e a reeleição fica cada vez mais distante. Palocci pode dançar, voltar a Ribeirão Preto.

E há a incógnita Kirchner. Uma no cravo, outra na ferradura, mas enfrentando numa certa medida, que é a da própria sobrevivência política, o poder do FMI.

Essa conversa de efeito dominó vem dos tempos do terrorista Henry Kissinger. A guerra do Vietnã. Sua estupidez, foi justificada com esse argumento. Se caísse o Vietnã, cairiam os países asiáticos ao seu redor. Logo era preciso afastar e eliminar o perigo comunista (sic).

Pérez Jiménez não tem nada a ver com Lúcia Gutierrez. Nem de longe. Era gorducho, asqueroso como todo ditador. Lúcia ao contrário é uma linda mulher. Nem nas pretensas benfeitorias. Lúcia reparte a sua coleção com a cultura e o povo de seu Estado, Minas, de seu país, Brasil. Pérez Jiménez guardou as suas na Suíça.

Kissinger hoje se chama Rumsfeld. Ou Condolezza Rice, a dos instintos. Que de perto passa longe de Lúcia Gutierrez.

A vitória de Chávez não. Preserva o poder de resistência dos sul americanos. Abre perspectivas para a luta popular. Até porque, dos tempos de Pérez Jiménez, até hoje, na imensa e esmagadora maioria dos países da América Latina, pouco, ou quase nada mudou para os trabalhadores e camponeses.

E esse o significado do evento político mais importante dos próximos tempos para os povos dessa região.