Fernando Henrique Cardoso apareceu com José Maluf Serra numa sinagoga. Foi pedir votos para seu candidato. Até aí nada demais. Paulo Serra Maluf, apesar da descendência árabe, também vai a sinagogas. Lá estão iguais, de um modo geral. Banqueiros, grandes empresários, classes médias. Queria ver FHC aparecer com Serra numa favela. Ou mesmo no centro […]
Fernando Henrique Cardoso apareceu com José Maluf Serra numa sinagoga. Foi pedir votos para seu candidato. Até aí nada demais. Paulo Serra Maluf, apesar da descendência árabe, também vai a sinagogas. Lá estão iguais, de um modo geral. Banqueiros, grandes empresários, classes médias.
Queria ver FHC aparecer com Serra numa favela. Ou mesmo no centro de São Paulo. Teria que ir acompanhado de um monumental exército de seguranças, em qualquer lugar assim, em qualquer canto do Brasil. É, lato senso, a síntese de toda e qualquer canalhice imaginável ou não.
Uma dos pressupostos de neoliberalismo é a corrupção. Num modelo de Estado privatizado e centralizado como o nosso, as cidades, qualquer uma, perdem suas características.
Cidades são o cotidiano do cidadão. Ali se nasce, crescemos, vivemos o dia a dia até o dia derradeiro. À época da ditadura os generais decidiam o preço do cafezinho da esquina e qualquer desrespeito às célebres tabelas implicava em processo com capitulação na lei de segurança, ou a tal da ordem econômica.
Do regime militar ficaram heranças nocivas não desmanteladas pelos governos dito democráticos, muito menos pelo Congresso Nacional Constituinte. As cidades continuaram submetidas ao tacão do Estado Nacional.
A lógica disso é simples e foi completada com a lei de responsabilidade fiscal: prefeitos cuidam de jardins, praças, educação básica, pagam o preço da saúde centralizada e dependentes dos recursos federais e estaduais, vivem à mercê dos negócios do neoliberalismo.
As ditas grandes empresas. O que cada cidadão não sabe quando enche a boca para proclamar a Ford, ou a Mercedes, ou a GM, qualquer uma, em sua cidade, é que paga para que essas empresas produzam carros. O custo de um Mercedes Classe A (a empresa interrompeu a produção. Muito caro. Está investindo tudo no candidato tucano para ganhar novos incentivos, vantagens, etc a partir do próximo ano), para cada um no município de Juiz de Fora, MG, é de 150 reais, mais ou menos. Novecentos reais paga o cidadão que vive em Minas Gerais pelo mesmo carro. Falo de unidade. Por unidade.
Incentivos fiscais, isenções, obras de infra-estrutura, o capital privado financiando pelo dinheiro público.
Câmaras de Vereadores, em qualquer município, não têm nem sentido e nem necessidade. A disputa por uma vaga de vereador por si só já prova isso. Os caras gastam horrores, se engalfinham por votos. Sabem que o negócio é bom e se não meter a mão, não entrar no esquema, o salário, só ele, já compensa o investimento.
Via de regra passam quatro anos de cada legislatura dando medalhas, títulos, benemerências aos grandes, costumam nem saber para que lado anda a cidade. Só lembrar o escândalo que envolveu vereadores paulistas há alguns anos. Vale para São Paulo, vale para qualquer cidade brasileira.
Conselhos cumpririam o papel com mais eficiência, maior participação popular, logo democracia efetiva e não custariam quase nada.
As eleições municipais só fazem confirmar que cidades se transformam, a cada dia, em play grounds, para usar uma expressão do líder terrorista George Bush, dos grandes negócios.
Partidos neoliberais, como PSDB, PFL, os dois principais, disputam cada prefeitura como se a própria vida estivesse em jogo. Não se trata bem da vida, mas do botim. Da grana.
Na confusão partidária que existe no Brasil, PPS vira um dos principais braços tucanos na disputa, ou reduto de projetos pessoais de «a» e «b». A batuta é de Roberto Freire, um dos grandes blefes da política brasileira.
Prefeitos íntegros ou com projetos voltados para avanços efetivos, em qualquer campo, enfrentam toda a sorte de dificuldades e são poucos os que sobrevivem. Não há porque não admitir que capitais como BH e Porto Alegre restam como exceções. Mesmo São Paulo, onde Marta não é Serra e nem Maluf, ou Pitta, três seres abjetos em todos os sentidos. Belém, outro exemplo.
Neoliberalismo significa a privatização do Estado. Você paga cá em baixo para o superávit primário lá em cima, o lucro dos bancos (bancários são explorados com salários de miséria), os jogos nas bolsas de valores, o fim das cidades como lugar onde, cada um de nós, por si e no todo, construímos o nosso dia a dia, vivemos esse cotidiano.
Numa cidade de Minas, pode ser qualquer cidade do interior do Brasil, a perspectiva de vitória de um candidato decente, falo de Santos Dumont, leva as elites a toda a sorte de violências, mentiras, ameaças, o de sempre.
Na área por onde a CONCER (empresa que ganhou parte da BR- 040, uma das rodovias mais importantes do País) atua o terror empresarial corre solto e livre, Cada Prefeitura ao longo trecho da CONCER é disputada a tapa, a tiros, ao que for preciso, para manter intactas as vantagens, intactos os privilégios.
As eleições municipais fazem parte do calendário da farsa democrática. Com um ou outro avanço ali só servem para mostrar que reformas políticas não mudarão o quadro.
A luta pela cidade como ponto de partida para o exercício cidadão da busca de um modelo alternativo não passa por essa democracia onde a propaganda gratuita é a mais cara e onde a Justiça Eleitoral diz o que pode e o que não pode ser dito. Por exemplo: um juiz proibiu que fossem revelados os votos de um deputado candidato a prefeito na Câmara Federal para não prejudicá-lo. Outra, uma juíza, saiu a medir os out doors para ver se estavam dentro dos padrões. Que padrões ninguém sabe, só ela. Não significa, no entanto, que candidatos que representem avanços, por menores que sejam, tenham que ser desprezados. Dentro do contexto que vivemos, no mundo orientado e iluminado pelo terrorismo norte-americano, logo imperial e neoliberal, a questão não chega propriamente a ser avanço nessa área, a institucional. Mas a percepção que cada retrocesso vai custar muito mais caro que devaneios pressupostamente revolucionários de arrebentar com tudo e todos, sem sair do mundo institucional.
Saída no mundo institucional? Não existe. Mas isso não quer dizer que tenha que ser entregue aos bandidos, a maioria já é deles. Arrebentar com o modelo passa por outros caminhos, diferentes do protesto institucional.
Ele, o institucional, todavia, está aí. Qualquer retrocesso é sempre avanço do lado de lá. Dos bandidos.