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Sobre a criação de um novo partido no Brasil: O que queremos

Fuentes: Rebelión

O que é o «novo»? Consideramos fundamental que qualquer discussão que se proponha a desenvolver algo que tenha como concepção de «o novo» deva necessariamente partir da contestação das estruturas estabelecidas.Um estudo da história, mesmo que superficial, nos dá conta que qualquer sistema implantado – qualquer que seja – empenhou-se sempre em construir alternativas que […]

O que é o «novo»?

Consideramos fundamental que qualquer discussão que se proponha a desenvolver algo que tenha como concepção de «o novo» deva necessariamente partir da contestação das estruturas estabelecidas.

Um estudo da história, mesmo que superficial, nos dá conta que qualquer sistema implantado – qualquer que seja – empenhou-se sempre em construir alternativas que visassem a sua manutenção, suas defesas e a implantação e satisfação dos interesses da oligarquia dirigente que desfruta de seus privilégios. As estruturas montadas, longe de atender os interesses coletivos e populares, sempre vieram ao encontro da manutenção do status quo vigente. Sob esse ponto de vista, podemos definir que a humanidade sempre viveu sob regimes opressivos, sejam eles violentos explicitamente ou obliquamente classificados como «democráticos».

Ultimamente vimos acompanhando uma discussão saudável, a qual envolve a contradição «institucional x autonomia». Temos acompanhado durante os últimos anos tentativas e exemplos de rebeldia – notadamente na América Latina – de mobilizações não dirigidas ou lideradas por interesses partidários, mas sim por interesses autenticamente populares, de tomada de consciência de classe e de desejo de mudança no sistema que oprime com a miséria e a exploração. Entretanto, a pergunta que incomoda: por quê esses movimentos, sejam eles o argentino, o boliviano, ou equatoriano, dentre outros, sempre terminaram por render-se à institucionalidade?

Seria cansativo e extenso demais explanar todas as novas alternativas positivas encontradas nessas rebeliões. Mais ainda extenso seria discutir as experiências zapatistas, as quais vêm se firmando como um grande exemplo de auto-gestão e autonomia. Esse assunto – seus exemplos e experiências – podem ser discutidos oportunamente.

Entretanto, concluímos que essas ações ainda buscam seus caminhos, experimentam alternativas e acima de tudo, se ainda não inventam novas fórmulas, vêm felizmente desinventando lógicas estabelecidas como verdades absolutas, das quais as burguesias se nutrem e se fortalecem.

O partido que não queremos

Devemos levar em conta o fracasso das experiências do socialismo no século passado e analisar, não a necessidade de se reformá-lo, mas sim a questão de como implantá- lo realmente, experiência que não temos, efetivamente. As raras experiências realmente socialistas que a humanidade testemunhou sempre foram de pequena duração: a democracia jacobina, a Comuna de Paris, os primeiros anos de Revolução soviética e o primeiro e parte do segundo ano da experiência nicaragüense, levada a cabo pela rebeldia sandinista.

Temos claro, entretanto, que o exemplo maior, o soviético, não aportou as bases para o desenvolvimento da sociedade sem classes, quer por haver se degenerado, quer se burocratizado, fatos determinantes para seu fim e sua rendição à lógica capitalista. O exemplo cubano, por outro lado, ainda estimula e determina discussões, se bem que devamos ter em conta que se trata de um país em estado de guerra constante, sob ataque imperialista e forte bloqueio econômico, portanto com uma necessidade premente de defender-se.

Amplos setores populares apresentam atualmente uma forte rejeição à concepção de partidos políticos. Encontramos saudável esse questionamento, na medida que a contradição possibilita um debate atual, aberto e franco e acelera a busca de novas alternativas e a construção de novas experiências.

Os partido políticos, tradicionalmente entidades verticalizadas e autoritárias, têm demonstrado que, mesmo quando em um primeiro momento apresentam preocupações populares, terminam por sofrer de uma forte tendência à degeneração, ao carreirismo e ao aparelhismo, quando suas preocupações iniciais são substituídas exclusivamente pelos interesses – pessoais e/ou corporativos – de suas classes dirigentes, quando suas ações diretas desaparecem em nome de uma atuação puramente institucional e burocrática, a qual sabemos, não trazem resultados práticos com a emergência necessária.

O que não desejamos identificar jamais no partido, mais ainda por tratar-se da construção de um «novo partido», é uma agremiação que venha a repetir indefinidamente as práticas que queremos ver extintas. A discussão – ampla, democrática, aberta e respeitosa – deve ser implantada em todas as instâncias partidárias, onde esperamos ver os interesses populares representados. Não desejamos construir algo que traga os vícios passados, os quais sabemos nocivos, excludentes, arrogantes e dirigidos para fins e objetivos escusos.

O partido que precisamos

Entendemos ser revolucionário tudo o que vem para mudar ou romper as estruturas implantadas e mantidas pelas classes dominantes, que inclusive usam da força para isso. O partido que precisamos e esperamos construir deve obrigatoriamente ser revolucionário a partir de dentro, desde suas práticas internas, suas relações com os interesses populares e ser, acima de tudo, uma ferramenta dos movimentos sociais, sem, entretanto, – e em momento algum – impedir suas autonomias. Somente construindo-o de baixo para cima, teremos êxito na luta na qual nos colocamos.

Vemos como revolucionária essa nova experiência, quando os movimentos – sociais, de trabalhadores, de agrupações com interesses específicos, dentre outros grupos ou setores – terão num partido político uma ferramenta de ação a mais de denúncia e de luta, e não o contrário, como tem sido a regra.

Entretanto, cremos que as mudanças estruturais e a transformação da sociedade não virão através das lutas travadas a partir dos parlamentos ou movendo-se dentro de regulamentos desenvolvidos e estabelecidos, em última instância, com o intuito de perpetuar a política de satisfação dos privilégios, da exploração e do abuso praticado pelas burguesias. Entendemos que esses regulamentos são estruturas desenvolvidas para defesa das elites, mantidas pelo sistema que desejamos alterar. Ao atuarmos utilizando-nos somente das práticas por elas – as classes dominantes – permitidas e institucionalizadas, perdemos o sentido de «novo e revolucionário» e passamos a reproduzir indefinidamente o sistema, inclusive fortalecendo-o e aprimorando-o, o que não nos interessa de maneira alguma.

Precisamos, portanto, de um partido que busque a imediata ruptura com a lógica capitalista e de dominação e que se coloque radical e intransigentemente, sem os tradicionais recuos ditos «estratégicos», na linha de frente contra o imperialismo, a opressão e a exploração.

Outros partidos já ousaram levantar essas bandeiras e sabemos onde chegaram e para onde levaram as massas que os acompanharam. Vivemos atualmente um claro exemplo da capitulação de classes dirigentes partidárias, encasteladas por décadas em altos postos de velhos partidos políticos que se renderam aos apetites do capital financeiro – nacional e internacional -, o verdadeiro responsável pela fome, miséria e morte em todos os países submetidos aos seus interesses. O resultado: a reprodução do sistema que diziam desejar extinguir e a indignação daqueles que acreditaram em seu projeto.

Um partido autenticamente popular e revolucionário – o que precisamos – não deverá em hipótese alguma construir alianças que não venham ao encontro das camadas populares. Um partido novo e com forte consciência de classe não deverá aliar-se ou render-se às tentações de se alcançar o poder através de alianças espúrias, mais ainda com os conhecidos setores reacionários e historicamente comprometidos com interesses anti-populares.

Um «novo partido» que deseje ser mais uma das tantas ferramentas de mudanças deve, acima de tudo, estar presente no incansável combate pela ruptura total com a estratégia de dominação global implantada e mantida em nossos países pela via da submissão fácil de nossos dirigentes.

Deve, ademais, ser internacionalista e solidário com as lutas populares que se desenvolvem no resto do mundo, sejam elas contra o capitalismo, o imperialismo, contra a globalização, contra o neoliberalismo, contra a lógica de mercado e estar ao lado de toda e qualquer luta que vise alterar a realidade excludente na qual somos mantidos.

A burocracia e qualquer eventual tendência ao totalitarismo devem estar fora de qualquer discussão do que desejamos seja «novo», visto que representam velhas práticas autoritárias. O partido que precisamos deve seguir no caminho da conquista da propriedade coletiva e social dos meios de produção e jamais na busca da propriedade estatal.

Conclusão

– O partido que desejamos deve ser democrático, popular, atuante, de ação direta e estar incondicionalmente ao lado dos anseios populares e a eles estar vinculado.

– Manter-se intransigentemente distante de qualquer aliança com os setores retrógrados, adversários históricos dos trabalhadores, dos setores populares e de todos aqueles que lutam e buscam a democracia verdadeira: a direta e participativa. Manter sempre a idéia de que nossos interesses são absolutamente irreconciliáveis.

– A existência de diversas correntes de opinião e anseios deve ser encarada como fator de enriquecimento, aprendizado e acúmulo de experiências trazidas por todos que vêm somar forças – patrimônio do partido – na medida em que favorece o entendimento dos diversos interesses e o conhecimento das necessidades reais dos diversos setores.

– O partido deve defender como princípio fundamental a criação de mecanismos autônomos, democráticos e participativos os quais permitam os trabalhadores decidirem os rumos do país, atentando-se única e exclusivamente aos interesses populares e excluindo-se qualquer satisfação dos interesses especulativos do capital, seja ele nacional ou internacional.

– O partido deve, do mesmo modo, desenvolver mecanismos o controle popular sobre as decisões de seus órgãos dirigentes e permitir o acompanhamento aberto e amplo de qualquer medida ou decisão tomada.

Por fim…

Esperamos haver aportado algo à discussão sobre a criação do «novo partido» e fazer dele uma alternativa de oposição real, radical, intransigente, completa, consciente e direta ao projeto de dominação global e de rapina financeira a que nossos países estão submetidos.

A descoberta – mais que a construção – de caminhos que levem nossos povos à reconquista de suas dignidades perdidas, de suas honras desrespeitadas, de suas riquezas roubadas e de seus sangues e corpos explorados é uma tarefa árdua, de resistência e muitas vezes de renúncia pessoal. É uma luta para poucos. Mas extraordinária.