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Fórum Social da Tríplice Fronteira: a nossa América que não se rende

Fuentes: Rebelión

A dinâmica dos fóruns sociais atravessa tanto as fronteiras dos movimentos e organizações quanto a dos países. Nas intersecções cada parte pode encontrar prolongamentos inesperados. A realização de um Fórum Social na tríplice fronteira entre Brasil, Argentina e Paraguai serviu para explicitar as dores transfronteiriças resultantes de mais uma década de políticas neoliberais.Nos dias 25, […]

A dinâmica dos fóruns sociais atravessa tanto as fronteiras dos movimentos e organizações quanto a dos países. Nas intersecções cada parte pode encontrar prolongamentos inesperados. A realização de um Fórum Social na tríplice fronteira entre Brasil, Argentina e Paraguai serviu para explicitar as dores transfronteiriças resultantes de mais uma década de políticas neoliberais.Nos dias 25, 26 e 27 de junho en Puerto Iguazu cerca de 1.000 participantes, representando dezenas de redes e organizações populares, puseram o Mercosul de ponta cabeça, colocando em pauta a integração das lutas dos setores populares dos países do cone sul. Predominou nas consignas comuns e nos diagnósticos de cada rede/organização a percepção do desastre que significou o engate forçado de nossas nações aos fluxos globais monopolistas. O sentimento anti-imperialista que ali prevalecia transcendia qualquer cacoete ideológico e aflorava como tragédia vivida, sofrida na pele na forma de desemprego massivo, quebra de direitos sociais e de modos dignos de se viver.

A articulação dos temas Dívida, ALCA e militarização não se reduzia à estrutura organizativa dos painéis e oficinas e se impunha mesmo nas mais despretensiosas intervenções individuais. Não se trata de nenhum aprendizado formal pelo qual tenham passado disciplinados militantes, mas sim de uma penosa conscientização de como nossas nações vem sendo tragadas nos marcos de uma globalização agressiva e devoradora. A mesma pauta regressiva de privatizações pulverizadoras das cadeias produtivas internas e de uma liberalização financeira selvagem atravessou como um esquadro os limites de Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. A integração do capital prosperou enquanto nossos países se arruinavam em meio a constantes fugas de capitais seguidas de reentradas condicionadas.

Esquadrinhando o território

Recursos naturais e geoestratégicos como petróleo, biodiversidade e água vêm sendo cadastrados e monopolizados, sob os auspícios de organizações multilaterais e sob vigilância estreita do exército imperial norte-americano. Um dos mais importantes painéis do FSTF tratou justamente de apontar para os riscos que acometem o Aqüífero Guarani.O primeiro conjunto de riscos se relaciona à militarização do corredor da tríplice fronteira por intermédio de exercícios militares conjuntos entre tropas argentinas e norte-americanas em Misiones, pelo monitoramento constante de Ciudad Del Este/Foz do Iguaçu por assessores militares e de inteligência norte-americanos, com a anuência das Forças Armadas paraguaias e da Polícia Federal brasileira.

O segundo conjunto de riscos se relaciona ao projeto que cria o Sistema de Informação sobre o Sistema Aquífero Guarani(SISAG) firmado pelo Mercosul com o Banco Mundial.Os países do Mercosul firmaram um acordo com Banco Mundial, OEA, BID e a Agência Internacional de Energia Atômica para aventar as possibilidades de aproveitamento do Aqüífero Guarani e ao mesmo tempo criar um marco regulatório estável e atraente para os investidores privados. O Aquífero Guarani serviria como uma preciosa reserva estratégica em tempos de escassez administrada da água. Ou seja, não somente seria um centro de abastecimento de atividades «sustentáveis» (no sentido do retorno delas) como também um estoque regulador, definidor do preço da mercadoria. Por isso, os investidores se esforçam por obter dados minuciosos como volume, limites, renovação, pontos sensíveis, ameaças, variação de composição química.

O projeto é sustentado por dois fundos mundiais(GEF e FMAM) vinculado a organismos multilaterais e que tem por propósito abrir novas fronteiras de negócios, com a cobertura de um eficiente marketing ambiental. O projeto pretende mapear não apenas o recurso natural mas todo o entorno econômico-produtivo que o cerca. Trata-se de um planejamento transnacional da infra-estrutura dos países do Mercosul, algo que deveria estar sendo levado a cabo por nossos Governos de forma soberana. Defendemos o cancelamento imediato desse projeto desterritorializante e o resgate do direito de pesquisa e controle nossos recursos estratégicos.

O desmonte atende pelo nome de «livre comércio»

As variações, avanços e recuos do processo negociador da ALCA devem-se a contradições que dizem mais respeito aos setores econômicos competitivos de Brasil e Argentina, em grande parte já transnacionalizados, e não a contradições de fundo que digam respeito a políticas de desenvolvimento e direitos sociais. A ALCA light representa justamente um momento de tensionamento em que os ajustes inter-monopolistas precisam discutidos pontualmente pelos segmentos do capital em rede. Não há diferença de enfoque, apenas diferenças setoriais, quanto a acesso a mercados, a acertar. A ALCA Light mantem as negociações nos trilhos, ainda que paralelos, ainda que mais complexas que o previsto. Essas contradições precisam ser aproveitadas, mas o objetivo é descarrillhar o trem, ou seja romper as negociações da ALCA e iniciar entabulações para uma outra integração

As tratativas mais afinadas e pragmáticas do Mercosul com a União Européia refletem o maior grau de complementaridade setorial entre as economias dos dois blocos, complementaridade construída pela participação direta de capitais europeus nas extensas e generosas privatizações implementadas por aqui na década de 90. Elas provam que os Governos brasileiro e argentino estão sendo fortemente pressionados pelas redes de contratistas, fornecedores e pelas próprias filiais das corporações européias para, que as negociações avancem mais rápido.

As fórmulas de dominação de metamorfoseiam e se desdobram. O território é sulcado pelos titulares dos cifrões sem o consentimento e contrariando os interesses dos que teimam em ser titulares de nações justas e democráticas. Se o território pode ser comum para o saque e a exploração, também pode se constituir em trincheira comum de resistência, plataforma para um novo modelo de economia e sociedade para ser espelho para um mundo sem espelho.

Temos que nos comprometer entre «nosotros» a reconstruir as economias desmanteladas da América do Sul. Mais que um projeto retórico ou principista de integração alternativa , precisamos de um programa sobre o qual se erga um arco de alianças com os setores econômicos e sociais depauperados por uma década de políticas privatistas e aberturistas. Não basta anunciar uma integração adjetivada- » solidária» ou «justa» – ou substantivada- «com distribuição de renda» ou «com políticas industriais ativas» – se não visualizarmos os caminhos operativos, o sequenciamento, os atores envolvidos e as fontes de financiamento. A América, terra que por séculos sediou a esperança de um mundo novo, não vai se render a um modelo de guerra permanente e de totalitarismo privado, que se pretende único e inexorável.

* Membro da ATTAC-Brasil. [email protected] Participou do Primeiro Fórum Social da Tríplice Fronteira representando a REBRIP/Rede Brasileira de Integração dos Povos