A demissão do professor Carlos Lessa, presidente do BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social) e sua substituição pelo ministro Guido Mantecca, do Planejamento e Gestão Estratégica (ele nem deve saber o que é isso), mostra a disposição do presidente de se inclinar mais ainda à direita. Lessa caiu na razão direta de uma […]
A demissão do professor Carlos Lessa, presidente do BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social) e sua substituição pelo ministro Guido Mantecca, do Planejamento e Gestão Estratégica (ele nem deve saber o que é isso), mostra a disposição do presidente de se inclinar mais ainda à direita.
Lessa caiu na razão direta de uma entrevista concedida na semana passada em que classificou a gestão do norte-americano Henrique Meireles como «pesadelo», à frente do Banco Central.
Sua demissão aconteceu antes que chegasse ao presidente da República um manifesto de intelectuais, dentre eles o arquiteto Oscar Niemeyer e o compositor Chico Buarque de Holanda, além de entidades como a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), a CUT (Central Única dos Trabalhadores) e a ABI (Associação Brasileira de Imprensa), de apoio ao demitido. O manifesto foi encaminhado pelo deputado Chico Alencar, do PT e um dos principais críticos do governo.
Carlos Lessa é a quinta baixa no governo desde as eleições municipais. As outras foram: o ministro da Defesa, José Viegas, o presidente do Banco do Brasil, Cássio Casseb, o advogado Luís Duboc Pinaud, e o jornalista Ricardo Kotscho. A sexta deverá ser o assessor especial Frei Beto. Afirma-se que o senador Aluísio Mercadante pode vir a ser o novo ministro do Planejamento. Seria uma forma de afastá-lo dos embates parlamentares onde se mostrou inábil e criou várias áreas de atrito.
Dentre os que estão saindo do governo o único crítico da política econômica foi Lessa. O resto saiu por razões distintas. Casseb chegou a ser convidado para substituir Lessa no BNDES e recusou.
Lula vai ter que conviver com as críticas de outro ministro. Nesse caso o vice-presidente José Alencar. Ele voltou a falar da política de juros altos e fez rasgados elogios ao presidente demitido do BNDES, Carlos Lessa. O vice-presidente disse que Lessa é «formidável», «patriótico» e «profundamente probo».
O ministro chefe do Gabinete Civil, José Dirceu, é um dos derrotados com a demissão de Lessa, fato que mostra o poder do grupo liderado por Henrique Meireles e que inclui o ministro da Fazenda, Antônio Palocci. Nesse caso, o da demissão de Lessa, inclui também o tucano Luís Fernando Furlan (Indústria, Comércio e Desenvolvimento) e o latifundiário Roberto Rodrigues, ministro da Agricultura e da MONSANTO.
É difícil entender a cabeça do presidente da República. Ora acha que anda sobre as águas, ora acha que vai mudar a história da humanidade, mas deixa assessores vazarem a notícia que preferia Bush a Kerry, manda tropas ao Haiti e não se imagina que ao convidar Carlos Lessa, no início do governo, estivesse supondo que o professor fosse aceitar as regras impostas pelo sistema financeiro internacional e manter o BNDES como nos tempos de FHC: um instrumento do processo de privatização e financiamento de empresas dos amigos do peito ou dos apoiadores.
Lula pode ser um tonto, um deslumbrado, mas não é um idiota. O fato só faz confirmar que o presidente não comanda coisa alguma, não tem idéia de nada e neste momento optou por cair de quatro para o neoliberalismo e a política econômica do banqueiro Henrique Meireles (Palocci é um mero executor, sua grande contribuição está na capacidade de fazer fofocas contra ministros adversários).
A saída de Lessa mais que sinaliza na opção do governo em termos de política econômica. Dá a partida na reforma ministerial e, claro, o tom do que vem por aí.
Tudo indica que o governo desistiu também de patrocinar mais uma tentativa de emplacar a reeleição dos presidentes da Câmara e do Senado (João Paulo e José Sarney) para segurar o PMDB no governo e a liberação de verbas para deputados e senadores começa a destrancar a pauta do Congresso mas…
Pode vir a significar a convocação extraordinária do Poder Legislativo. O que, em termos percentuais é mínimo, diante das despesas do governo, mas em termos políticos tem o custo de uma abonada respeitável nos bolsos dos parlamentares.
O governo, apesar disso, sofreu uma derrota na votação da reforma do Judiciário (que não reforma coisa alguma). Não conseguiu jogar para escanteio a responsabilidade imediata sobre suas dívidas. Os famosos precatórios. Isso tanto beneficia empresas privadas, como assegura direitos de funcionários públicos sistematicamente lesados por todos os governos ao longo dos anos e da história.
As declarações do ex-presidente Fernando Henrique, feitas no exterior, que Lula não é imbatível e depois de tecer considerações sobre eventuais candidaturas de seu partido à sucessão presidencial em 2006, têm um sentido. FHC quis e quer saber a repercussão daquilo que fala para saber se pode ou não alimentar o sonho de voltar ao Planalto.
Por enquanto não tem chances e se vier a ter será por obra do governo Lula. A velha história do coloca a vaca na sala, tira a vaca da sala.
Um outro aspecto é que a reforma ministerial pode estimular setores do partido do presidente a pularem fora do barco de uma vez. Nesse caso não iriam esperar o processo de eleições internas no PT. O jogo é de cartas marcadas.
Uma pesquisa divulgada pela BBC e feita pelo Instituto Gallup, em todo o mundo, mostra que, no Brasil, 89% dos jovens entre 16 19 anos acha que os políticos são desonestos. E 72% acreditam que os empresários brasileiros cedem às pressões de grupos poderosos. Fica claro que a luta popular no Brasil não tem saída dentro do processo institucional.
É a cara do governo Lula e do próprio presidente. Só falta chamar Bush para o desfile de sete de setembro e pespegá-lo com a Ordem do Cruzeiro do Sul.
A saída de Carlos Lessa tem um caráter que ultrapassa o professor e economista: é a opção preferencial de Lula e sua turma pelo neoliberalismo. Agora de forma explícita.