As notícias mais recentes não são nada animadoras para os trabalhadores do mundo inteiro. Aproveitando-se do avanço tecnológico, em que a mão-de-obra se torna cada vez menos exigida, os donos do grande e do pequeno capital esmeram-se nas artimanhas e pressões para «sugar o pouco sangue que ainda circula nas veias» dos que produziram e […]
As notícias mais recentes não são nada animadoras para os trabalhadores do mundo inteiro. Aproveitando-se do avanço tecnológico, em que a mão-de-obra se torna cada vez menos exigida, os donos do grande e do pequeno capital esmeram-se nas artimanhas e pressões para «sugar o pouco sangue que ainda circula nas veias» dos que produziram e produzem suas riquezas.
Da França nos vem a informação de que os operários da Bosch francesa aceitaram um novo contrato de trabalho que estipula 36 horas semanais, no lugar das 35 atuais, e, pasmem, sem aumento de salário ou de qualquer outro pagamento pela hora extra adicionada. Isso se deu à revelia dos poderosos sindicatos franceses. «Porteira que passa um boi…». O que virá logo depois? O fato se deve à aplicação do mesmo regime em várias empresas alemãs. A origem dessas mudanças franco-alemãs está na recente entrada de países do leste europeu na CE (Comunidade Européia), como a República Checa e Polônia, onde os salários são muito mais baixos. Enquanto o salário mínimo na França é de aproximadamente 1.100 Euros, naqueles países não ultrapassa os 300 Euros. Daí a estratégia das grandes empresas de pressionar o achatamento salarial com a chantagem de possível transferência de suas fábricas para o «novo paraíso» do capital.
O jornal estadunidense, Financial Times, já tinha publicado artigo de Guy Jonquieres mostrando que o crescimento da economia nos Estados Unidos não gera emprego. Aliás, o desemprego cresce constantemente também lá.
No entanto, se nos EUA e na Europa – que chegaram a ter anos a fio de «pleno emprego» – cresce o desemprego, destroem-se direitos adquiridos e achatam-se salários, ainda que em dose pequena, no Brasil esse sugadouro já atinge a barbárie: o governo vem promovendo reformas que eliminam direitos dos trabalhadores e, descaradamente, promete ampliar as reformas com a flexibilização de todos os direitos trabalhistas. Segundo dados fornecidos pelos departamentos encarregados das pesquisas, uma pequena retomada de crescimento da economia industrial, no primeiro semestre do ano, levou à criação de cerca de um milhão de empregos. Porém, sete entre dez foram contratados com salários que não ultrapassam dois salários mínimos e cerca de 400.000 contratados ganham entre meio e um salário mínimo; no semestre, houve mais de 4 milhões de trabalhadores que perderam seu emprego por causa do rodízio, e os que conseguiram novo emprego tiveram seus salários rebaixados em 40% em média.
No mandato de Lula, o percentual dos que ganham no máximo dois mínimos subiu para 72,13%. Simultaneamente, a imprensa anuncia nova remarcação de preços pelas indústrias. Ora, se o Brasil inteiro gritou contra a sacanagem do mínimo de R$ 260,00, como então se explica a contratação de trabalhadores por salários que implicam em sonegação do próprio mínimo estabelecido por lei? Se os salários são rebaixados, o que explica então essa remarcação de preços? Somente a barbárie, a avidez por lucros exorbitantes, o crime contra a economia popular podem explicar o fenômeno. É o modelo econômico que aprofunda o poço da exploração e exclusão social.
Daí que ficam as perguntas, tantas vezes repetidas nas páginas do Correio da Cidadania: Por que, então, o governo, oriundo das classes trabalhadoras, segue mantendo um enfoque de crescimento da economia orientado pelos mesmos parâmetros do neoliberalismo, desse modelo que vem fazendo água no mundo inteiro, e que vem jogando os países do 3º mundo num abismo sem precedentes? Por que o governo insiste em beneficiar o capital espoliador, com prejuízos irreparáveis para os trabalhadores e suas famílias? Por que o governo insiste em não ouvir o conjunto das forças sociais que clama por uma ruptura com tal modelo, que apela para a coragem de iniciar um novo ciclo de desenvolvimento econômico e social embasado em nosso extraordinário potencial e com as reservas de recursos que temos? Por que não ouvir o grito dos mais de 55 milhões que sofrem com as enormes carências no atendimento às suas necessidades básicas?
E ainda há os que pensam que esse governo está em disputa! Ainda há os que acreditam que tudo vai mudar nos próximos meses! É pena que as pessoas não leiam e não ouçam o que escrevem aqueles que detêm postos chaves no governo! É pena que não abram os olhos e ouvidos para as palavras do todo poderoso Palocci, afirmando com freqüência que essa política está no rumo certo e não vai mudar, ou do Meirelles, quando afirma que a política de juros vai permanecer por muito tempo ainda! Tais pessoas não percebem que, apesar das denúncias de corrupção que atingem os altos escalões do governo, Lula insiste em mantê-los em seus cargos, ou seja, «mantém as raposas tomando conta do galinheiro», ou ainda, no jargão bíblico, «mantém os lobos tomando conta das ovelhas».
Estamos diante de um governo que mantém o país refém do neoliberalismo que suga o povo, que atende «aos clamores» do FMI, mas que despreza o povo e que encaminha o país para o abismo. É o capital vencendo a luta contra o trabalho. O povo que votou na esperança não merece tanto desprezo, tanto sofrimento e desilusão, não merece tamanha traição. Está na hora deste povo ocupar as ruas para que as mudanças aconteçam, antes que seja tarde demais.
* Waldemar Rossi é metalúrgico aposentado e coordenador da Pastoral Operária da Arquidiocese de São Paulo.