O assassinato de cinco trabalhadores rurais sem terra num acampamento próximo a Governador Valadares, Minas Gerais, tem todas as características das ações paramilitares, semelhantes às que ocorrem em outros países latino-americanos e sempre voltadas para a defesa dos interesses dos latifundiários, das oligarquias urbanas, os verdadeiros donos do Estado privatizado e a serviço do modelo […]
O assassinato de cinco trabalhadores rurais sem terra num acampamento próximo a Governador Valadares, Minas Gerais, tem todas as características das ações paramilitares, semelhantes às que ocorrem em outros países latino-americanos e sempre voltadas para a defesa dos interesses dos latifundiários, das oligarquias urbanas, os verdadeiros donos do Estado privatizado e a serviço do modelo político e econômico desenhado e imposto pelo capitalismo.
Os paramilitares chegaram ao amanhecer, mataram, feriram e queimaram um acampamento onde trabalhadores estavam há dois anos pelo menos. Fugiram em uma van e num microônibus. Segundo cálculos das testemunhas eram quinze.
A chacina sugere que o latifúndio, organizado nacionalmente em estrutura paramilitar, tenha decidido vingar a decisão do Tribunal de Justiça do Pará que, na sexta-feira, determinou a prisão dos dois comandantes do massacre de Eldorado do Carajás. E, ao mesmo tempo, soa como sinal de alerta diante da resistência do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra) ao processo de controle da agricultura brasileira pela multinacional Monsanto.
O agro negócio, hoje, na medida que transforma o Brasil em grande exportador de matérias primas ou produtos primários, avança sobre a terra em proporções absurdas. Já existe cultivo de soja transgênica no Estado do Maranhão. O modelo de cooperativas de trabalhadores, ou de pequenos agricultores, está condenado à dependência ou a desaparecer e o próprio País tem sua soberania ameaçada já que essa dependência, principalmente em relação à Monsanto, que nos transforma em entreposto do capital estrangeiro, liquida a agricultura brasileira.
O latifúndio tem o comando do Ministério da Agricultura. Roberto Rodrigues, nomeado por Lula, é um dos fundadores da UDR (União Democrática Ruralista), versão brasileira da Ku Klux Klan, ou dos paramilitares colombianos, organização de extrema-direita e que se contrapõe à reforma agrária.
Tem o controle de numerosa bancada de deputados e senadores, de setores chaves do governo, como dito, do próprio Ministério. Para aprovar o salário mínimo na Câmara o governo Lula recorreu à chamada bancada ruralista.
Apóia-se numa aliança com as elites urbanas e quando ameaçado reage como agora em Minas Gerais.
A região de Governador Valadares é pródiga em conflitos nessa área. Em Minas Gerais a ação do latifúndio tem o apoio do governo do Estado e das autoridades policiais (por mais que dissimulem e falem em lei) e isso acontece historicamente, o que não difere muito do resto do Brasil, onde lideranças camponesas são sistematicamente assassinadas.
Quando do golpe de 1964, o então presidente da Federação da Agricultura de Minas Gerais, Josafá Macedo, distribuiu armas a fazendeiros em todo o Estado com recomendações para que fossem eliminados integrantes das antigas Ligas Camponesas.
Em Governador Valadares vários trabalhadores foram assassinados. A repercussão dos crimes foi tão grande que numa farsa que caracterizava a ditadura militar acabaram sendo levados a julgamento. Foram absolvidos pela Justiça Militar Federal e defendidos por um deputado da antiga UDN, Licurgo Leite Filho, ele próprio um latifundiário.
Caberá à Polícia Federal apurar a chacina. Há testemunhas, os sobreviventes e são inúmeras as pistas.
Uma das razões de crimes semelhantes ao de sábado decorre da lentidão do Governo Federal no processo de reforma agrária. A burocracia, muitas vezes azeitada pelos latifundiários, acaba contribuindo para que fatos assim aconteçam.
As contradições do governo Lula, um triste espetáculo de nau sem rumo, geram também contraditoriamente, reações estúpidas dos grupos paramilitares, tanto quanto encontram respaldo em setores estratégicos do governo, no caso o Ministério da Agricultura e na total falta de liderança do presidente, incapaz de resistir às pressões para permitir o plantio de transgênicos.
De qualquer forma a chacina de sábado tem um recado e esse recado diz respeito à decisão do Tribunal de Justiça do Pará, algo como «estamos vivos». Registre-se que nenhum dos dois oficiais condenados foi preso. Ao tomarem conhecimento da decisão refugiaram-se num hospital, onde restam «doentes».
Como é usual a grande imprensa não deu destaque ao fato. Faz parte da cumplicidade com o latifúndio. Logo, com os crimes praticados por esses grupos.
O latifúndio no Brasil, em qualquer lugar, tem tentáculos estendidos pelos chamados poderes constituídos. No Judiciário, só para lembrar, causou indignação o voto da ministra do STF (Supremo Tribunal Federal) Ellen Gracie, relatora num processo de desapropriação da fazenda de um ex concunhado. Impedida legal e moralmente a ministra não teve escrúpulo algum em votar pela «família».
Foi no ano passado e a fazenda localiza-se no Rio Grande do Sul, um dos estados brasileiros onde o latifúndio tem ostensivamente estrutura paramilitar, controla o governo do Estado (Germano Righotto) e despejou rios de dinheiro para derrotar o candidato da esquerda à Prefeitura de Porto Alegre, elegendo um preposto, José Fogaça.
Os movimentos populares estão mobilizados para impedir que a apuração da chacina de Governador Valadares termine impune e na região é grande o clima de comoção. A estupidez e a bestialidade da ação paramilitar revoltou a maioria da população na região, uma das mais pobres do Brasil.
O município é o de Felisburgo e o acampamento, ironicamente, se chama «Terra Prometida».
A chacina dos paramilitares brasileiros coincide com o ato terrorista dos «democratas» venezuelanos matando o fiscal Danilo Anderson e a visita do líder do IV Reich, George Bush, ao Chile. Não significa, necessariamente, que tenham sido atos planejados, significam que é a prática das oligarquias.
Não foi gratuita e nem visava apenas o acampamento de Felisburgo.
É também um sinal a um governo fraco e perdido, o de Lula.
Celso Furtado num determinado instante de sua extraordinária vida disse que o «MST é o movimento mais bonito dos últimos tempos»