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Propaganda eleitoral gratuita

Fuentes: Rebelión

O ministro Sepúlveda Pertence, um dos poucos independentes do Supremo Tribunal Federal e, pelo critério de rodízio, atual presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), disse há dias que se faz necessária uma discussão em torno da propaganda eleitoral gratuita. O ministro observou que o modelo vigente não atende aos propósitos fundamentais da lei: democratizar o […]

O ministro Sepúlveda Pertence, um dos poucos independentes do Supremo Tribunal Federal e, pelo critério de rodízio, atual presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), disse há dias que se faz necessária uma discussão em torno da propaganda eleitoral gratuita. O ministro observou que o modelo vigente não atende aos propósitos fundamentais da lei: democratizar o processo eleitoral através da cessão de tempo em rádios e tevês aos partidos políticos e, por conseqüência, aos candidatos.

O programa Observatório de Imprensa, do jornalista Alberto Dines, um dos mais sérios e competentes profissionais do jornalismo brasileiro, levantou e promove um debate importante, sobre outro aspecto que transforma o processo eleitoral brasileiro num jogo de carta marcadas: o controle de emissoras de rádio e tevê (as chamadas repetidoras nos estados e municípios), por parlamentares. Seja através de parentes, empresas em nome de testas de ferro, fundações, enfim, os expedientes possíveis para tal.

São dois assuntos que acabam se entrelaçando.

A propaganda eleitoral gratuita no Brasil surgiu através de um projeto de lei do deputado federal Adauto Lúcio Cardoso, um dos mais brilhantes parlamentares da história do País. Aprovado pelo Congresso, só não lembro se entrou em vigor já nas eleições de 1958, ou se em 1962, mas para o que quero dizer, isso é irrelevante.

O projeto original estabelecia que os partidos tinham tempo proporcional em todas as emissoras de rádio e tevê no Brasil e esse tempo seria usado ao vivo pelos candidatos credenciados pelos respectivos partidos, aqueles pelos quais disputavam eleições. Não estabelecia a obrigatoriedade de formação de cadeia por parte das emissoras e nem falava em programação prévia, ou seja, gravada. O horário era do partido e pronto.

A lei Adauto Lúcio Cardoso, vamos chamá-la assim, privilegiava os municípios, através do uso pelos partidos das tevês e rádios e isso trazia consigo outro importante objetivo: evitava que a propaganda eleitoral gratuita fosse usada a critério dos medalhões da política estadual.

Em 1966 foi decisiva para a vitória do então MDB em várias grandes cidades brasileiras, como fora, em 1965, um ano antes e um ano depois de golpe militar de 1964, instrumento poderoso para a vitória de dois candidatos de oposição à ditadura, malgrado os perfis de homens de centro: Negrão de Lima, no Estado da Guanabara (a cidade do Rio de Janeiro era um Estado da Federação) e Israel Pinheiro, em Minas. Ambos ligados a Juscelino Kubistchek, ex-presidente e já cassado pela ditadura militar.

Foram as vitórias de Negrão e Israel que levaram o presidente/ditador Castello Branco a extinguir os partidos políticos existentes e a cingir o espectro partidário brasileiro à camisa de força do bi-partidarismo.

As eleições de 1970 foram o prenúncio da derrota que a ditadura sofreria em 1974, onde a propaganda nos moldes determinados pela lei de Adauto Lúcio Cardoso seria fundamental. Em 1970 o número de votos brancos e nulos superou o de votos válidos, a despeito da vitória da ARENA, partido dos militares.

Foi em 1974, no entanto, que os ditadores perceberam o alcance da lei de propaganda eleitoral gratuita e foi ali, depois da derrota, que mudaram de forma draconiana a referida lei que, do seu espírito democrático, involuiu para o caráter show, espetáculo, descaracterizando de vez a preocupação e os objetivos iniciais.

Para se ter uma idéia do que aconteceu basta lembrar duas situações: no antigo Estado do Rio, o senador Paulo Torres, presidente do Senado, marechal e homem do regime militar, concorria com o atual senador Roberto Saturnino, oriundo do antigo PSB (Partido Socialista Brasileiro). Saturnino que entrara 15 dias antes das eleições (havia morrido o candidato original da oposição), fez sua campanha toda usando 15 minutos de televisão por dia, em horário nobre.

Como as imagens chegavam a determinadas regiões de Minas Gerais, levou o candidato ao Senado em Minas, Itamar Franco, ao seu programa. Levou o candidato do antigo Estado da Guanabara, transformou os 15 minutos diários que dispunha em impressionante palco para a luta pela redemocratização do Brasil.

Foi assim no Nordeste, onde o candidato Marcos Freire derrotou o candidato da ditadura, um poderoso cacique político, João Cleofas e irradiou para toda a região as candidaturas dos outros estados. No Nordeste a oposição só perdeu no estado do Maranhão. E mesmo assim porque Henrique La Roque, vencedor, disputou sozinho, o MDB não lançou candidato no Estado.

A bancada do partido cresceu significativamente na Câmara Federal, foram 17 vitórias na disputa para o Senado além de vitórias expressivas em todas as assembléias legislativas.

Os programas eram ao vivo e isso, simplesmente, naquele momento, colocava os partidários da ditadura na obrigação de defender a tortura, a censura à imprensa, falar de um milagre econômico que existia só no papel e nos lucros dos bancos e das grandes empresas, sem marqueteiros. Ou seja: não tinham como dizer que Omo lavava mais branco.

A reação da ditadura foi simples e como qualquer reação de qualquer ditadura: um ato de boçalidade e arbítrio. O presidente/ditador Ernesto Geisel suprimiu o direito dos candidatos falarem e trocou o debate por retratinhos com os números e as principais qualidades. Emudeceu a propaganda eleitoral gratuita. Consciente que a vitória do MDB prenunciava dificuldades no controle do Parlamento, forçou a barra e editou o chamado Pacote de Abril, onde adiou as eleições diretas para governador (estavam previstas para 1978) e criou a figura do senador indireto, conhecido como biônico.

Com o advento da constituição de 1988, o então senador Mário Covas, ainda no PMDB e relator da comissão de sistematização num primeiro momento, propôs a retomada do modelo antigo, o da Lei Adauto Lúcio Cardoso.

Enfrentou, aí, a oposição das grandes redes de tevê, já estava concentrado o setor entre nós, não conseguiu superar os obstáculos e o que temos hoje é um modelo espetáculo. Onde os efeitos especiais valem mais e o candidato vale menos. Como transformar Boris Karloff em James Dean.

Você vende Fernando Henrique como um sujeito direito. Ele por exemplo, transformou concessões de canais de rádio e tevê em moeda de troca na compra de votos para aprovar a reeleição. José Maluf Serra como homem sério. Paulo Serra Maluf como tocador de obras. Aécio Neves, sem abrir a boca, como o novo na política. A esperança. Lula prometeu o tempo todo que ia mudar, adequa-se às regras e some o debate livre, solto, pois a grandes redes o fazem em termos nacionais, segundo seus critérios, muitas vezes, como no caso da eleição do assaltante Collor de Mello, segundo os interesses da Globo.

O controle das chamadas repetidoras de tevê e dos canais de rádio por parlamentares começou a prosperar no período da ditadura. O governo militar afagava políticos em troca de apoio no Congresso, pois sabia que a turma tinha preço. Vai daí que gente como ACM (que foi ministro das Comunicações), José Sarney, Jader Barbalho, uma infinidade de senadores, deputados federais, deputados estaduais, são detentores de concessões de canais de rádio e tevê. Em todo o País.

Para se ter uma idéia do que isso representa, nas eleições de 1994, para o governo do Maranhão, na véspera do pleito, o Jornal Nacional, principal noticioso da Globo, divulgou uma pesquisa em que Roseana Sarney aparecia atrás do seu adversário, não me lembro quem agora. A repetidora da Globo no Estado, de propriedade da família Sarney, não exibiu o dito Jornal Nacional naquele dia. Roseana venceu as eleições, ouve denúncias comprovadas de fraude e ficou por isso mesmo.

Isso aconteceu e acontece aos montes no Brasil.

Se tevês e rádios são concessões do poder público, jornais não. ACM controla as comunicações na Bahia. Sarney, no Maranhão. Collor, em Alagoas. Jader Barbalho tem um império no setor no Pará. E centenas de emissoras são propriedades de deputados, senadores, amigos do peito (os testas de ferro), reproduzindo a lógica do poder, na medida que o poder é a classe dominante.

Jader Barbalho, por exemplo, bandido de alto coturno, foi preso em 2001 na sede do seu jornal em Belém do Pará. É comum jornais, tevês e rádios dos políticos não noticiarem fatos que não interessam. Aliás, não é comum, é regra geral.

A propaganda eleitoral gratuita e o controle dos meios de comunicações no Brasil precisam ser rediscutidos como fator prioritário para o avanço da democracia no seu sentido popular. Não essa farsa a que Saramago se referiu: «a democracia é uma farsa. Você vota para mudar e não muda nada. Continua mandando o FMI».

Está aí Lula que não deixa o extraordinário escritor português mentir. E nem ninguém que concorde com ele.