A semana de 27 à 1º de outubro foi marcada pelas declarações do dirigente máximo do FMI, Rodrigo Rato, no jornal espanhol El País, que acabaram repercutindo em toda a América Latina. Afinal, o receituário do organismo financeiro é livro de cabeceira da maioria dos dirigentes que vive abaixo da linha do equador. Rato foi […]
A semana de 27 à 1º de outubro foi marcada pelas declarações do dirigente máximo do FMI, Rodrigo Rato, no jornal espanhol El País, que acabaram repercutindo em toda a América Latina. Afinal, o receituário do organismo financeiro é livro de cabeceira da maioria dos dirigentes que vive abaixo da linha do equador. Rato foi claro: a economia mundial está em seu melhor momento, embora o déficit estadunidense e o pequeno crescimento da Europa sejam vistos como problemas a seres superados. Por outro lado, enfatiza, as políticas econômicas levadas por Chile, Brasil, China, Uganda e Vietnã são muito positivas. Segundo ele, o fundo já está trabalhando com programas de redução da pobreza e perdão da dívida dos países mais pobres. Para isso estão estabelecendo iniciativas para cuidar que as dívidas, uma vez reduzidas, não mais aumentem.
Como um pai amoroso, Rato fala em solidariedade, dizendo que os ricos devem dar acesso, a seus mercados, aos países pobres e, estes, precisam saber melhor governar. «Foi o FMI quem cortou a crise na Coréia, México, Brasil, Turquia e Índia. Sem isso, não teria havido equilíbrio nas contas», festeja, e cita um exemplo de bom governo, o do Brasil, que conseguiu fazer com que as más profecias não se realizassem, com Lula atuando corretamente.
Sem pejo, dá receitas consideradas imbatíveis. Os países em crises devem cortar gastos. Se não o fazem, não podem culpar o FMI pelos insucessos. «Não somos o governo econômico do mundo, só estamos a serviço dos governos, visando melhorar suas políticas econômicas.
De certa forma o dirigente não mentiu. Não é de hoje que a relação países x FMI se dá na perspectiva do que Ruy Marini chamou de cooperação antagônica. Ou seja, não é um simples aceitar as políticas alienígenas, mas é também colaborar ativamente para a expansão imperialista. Uma espécie de servidão voluntária, em que o servo age como tal, esperando levar vantagens na coleta das migalhas que sobram ao poder. Um exemplo disso é a triste figura do presidente panamenho, Torrijos, em Nova Iorque, durante reunião da ONU. Pressionado por um repórter que queria saber como o Panamá apoiava o presidente Bush na invasão do Iraque, tendo já sido invadido uma vez, se esquivou dizendo que a história é distinta e os conflitos entre Panamá e EUA já desapareceram. «Agora temos que trabalhar uma agenda comum de cooperação».
Mas, se os dirigentes são colaboracionistas, as gentes que sofrem as políticas não estão caladas. Em todo o continente, as lutas se fazem e o fio condutor da maioria delas é a não aceitação das receitas do FMI, aplicadas sistematicamente pelos governantes de plantão. Na Argentina, os piqueteiros fazem novos protestos exigindo que o governo amplie os recursos para as áreas sociais. Desempregados fazem greve de fome e trabalhadores fazem marcha sob a bandeira de «lutar não é delito». O presidente Kirchner faz discurso duro contra o FMI, chamando Rato de «patrão de estância», mas, no fundo, é tudo jogo de cena. Afinal, quem se comporta como patrão de estância é ele mesmo ao criminalizar a luta social no seu país.
Em Honduras, enfermeiros entram na segunda semana de greve em luta por aposentadoria digna. Na Universidade Nacional Autônoma entram em greve também os trabalhadores, exigindo aumento salarial. No Equador, 14 mil trabalhadores da saúde estão parados contra a privatização no setor. Enquanto isso, o governo abre as portas para o capital estrangeiro tomar conta da Petroequador, desnacionalizando mais um espaço estratégico. Assim como a Guatemala firma novo acordo com o FMI, depois de receber atestado de bom comportamento, oferecendo 2% do PIB para o pagamento da dívida, enquanto mais de 54% de seu povo vive abaixo da linha da miséria.
Na Colômbia, os caminhoneiros entraram na terceira semana de greve. Protestam contra o alto preço dos combustíveis e pedágios. No Brasil há manifestações contra a liberação dos transgênicos. Em Porto Rico os trabalhadores da empresa de abastecimento fazem greve, lutando contra a privatização. O México e o Panamá estão em batalhas parlamentares, discutindo a reforma do estado.
Cada uma dessas lutas é a reação da comunidade das vítimas, como bem diz Enrique Dussel. Aqueles que, acossados pelos políticas colaboracionistas, não se deixam ficar em choramingas. Levantam-se e lutam. São reações pontuais, ainda desconectadas. Mas, no fundo, cada uma delas é parte do grande mosaico de resistência dos povos da América Latina e, «a despacio» vão provocando estragos na pintura do capital. É o caso da luta do povo de Cajamarca, no Peru, que impediu a destruição de seus recursos naturais por uma mineradora estrangeira. Agora, seu exemplo está fazendo explodir revoltas e protestos em outras regiões do país onde outras mineradoras provocam destruição. Como eles, estão à espreita pelos vales, montanhas e planuras, todos os que sabem que uniões entre tubarão e sardinha não pode dar coisa boa. Mesmo que o Rato insista que sim.
Nesta semana, a vida que vive vai em frente, e as gentes resistem!!!