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Petróleo: salvação ou perdição?

Fuentes:

«É impossível entender a Venezuela sem entender o petróleo», diz o professor da Universidade Nacional da Venezuela e autor de um livro sobre o petróleo e o poder, Luís Lander, que participou da primeira edição das Jornadas Bolivarianas, promovida pelo Observatório Latino-Americano, em Florianópolis, SC. Ele conta que, no solo venezuelano, há, pelo menos, mais […]

«É impossível entender a Venezuela sem entender o petróleo», diz o professor da Universidade Nacional da Venezuela e autor de um livro sobre o petróleo e o poder, Luís Lander, que participou da primeira edição das Jornadas Bolivarianas, promovida pelo Observatório Latino-Americano, em Florianópolis, SC. Ele conta que, no solo venezuelano, há, pelo menos, mais 200 anos de possibilidade de exploração do ouro negro e é justamente nele que está focalizado o conflito que se explicita hoje entre a proposta de soberania de Chávez e os interesses de uma elite local, predadora e entreguista. «Isso ainda levando em conta que não começamos a prospectar o mar».

A história da Venezuela no centro do jogo do poder começou em 1922 quando rebentou o primeiro poço de petróleo. Seis anos depois, o país já era o primeiro exportador do mundo. Hoje é o quinto no planeta, as divisas geradas chegam a 26% do PIB, é responsável por 50% do ingresso fiscal e 80% das exportações. São três milhões de barris por dia. Segundo Lander, as reservas já propectadas somam 78 trilhões de barris, o que equivale a 75 anos de exploração no mesmo ritmo de hoje, mas, há ainda o que chamam de «reservas prováveis», que podem chegar a mais 200 anos.

Até 1976 o negócio do petróleo estava nas mãos do empresariado mas, a partir daquele ano, foi criada a lei de nacionalização da indústria. Foi aí que nasceu a PDVSA. «De qualquer forma, mesmo nas mãos do governo, a gerência era tocada no ritmo e no modelo das empresas transnacionais. A cultura empresarial se mostrava intocável e havia uma arrogância da gerência petroleira em querer ditar as políticas públicas», conta o professor. Para se ter uma idéia, até 1994, época de uma grande crise fiscal, a empresa nunca pagou dividendos ao Estado. Era completamente autônoma e descolada da vida do país.

O modelo de empresa nacional, ainda que descolada da vida, perdurou até os anos 90, quando a casta empresarial encastelada na PDVSA começou a impor um conjunto de medidas que apontavam para a privatização explícita em vários setores do petróleo. «Foram contratadas empresas privadas para explorar os campos maduros, aqueles que precisam de mais investimento tecnológico. Hoje, são esses contratos os que mais custam caro ao governo, pois os empresários nunca têm perdas».

A lógica do negócio bom para o empresariado e ruim para o governo – e o povo – imperou. Houve a abertura total do mercado de gasolina, o governo perdeu completamente o controle sobre os preços, tudo era ditado pelo capital. Foi nesse cenário que se inscreveu a candidatura de Hugo Chávez. Na campanha presidencial, em 1998, todos os demais candidatos pregavam a abertura total do mercado do petróleo, menos Chávez. Ao contrário, ele falava em nacionalizar, só que, desta vez, de verdade. Para os Estados Unidos, principal importador do petróleo, Chávez era tudo o que não queriam. Com ele, haveria uma inversão das prioridades e a riqueza gerada pelo petróleo poderia fugir do controle dos empresários nacionais e internacionais.

Segundo Lander, com a vitória de Hugo Chávez tudo mudou. O governo principiou a retomar o controle de preços, mudou o regime fiscal petroleiro, aumentou o controle político sobre a empresa e voltou a reconstruir a OPEP (Organização dos Países Exportadores de Pretróleo), que andava em baixa. «Foram promulgadas duas leis que modificavam todo o sistema petroleiro, dando mais ganho ao Estado. Com elas, foi recuperado o ingresso fiscal, houve maior industrialização e mais incentivo para o setor nacional. Foram recuperadas décadas de entreguismo».

O professor conta que, atualmente, a reda gerada pelo petróleo está sendo investida no povo, nos programas sociais, escolas, hospitais, etc… A Venezuela possui quatro refinarias dentro do país e mais 19 fora, com capacidade de refinar até quatro milhões de barris. É uma riqueza poderosa que começa a ser revertida para o próprio país. «E foi justamente essa mudança no processo petrolífero que levou os funcionários da PDVSA a fazerem a greve em 2002». O fato era que o controle havia fugido das mãos do entreguismo. Foi uma queda de braço entre o funcionalismo comprometido com ganhos pessoais e interesses alheios e a maioria da população. Chávez foi duro. Enfrentou a greve e retomou o controle político sobre a PDVSA.

No último ano, dos 41 mil trabalhadores da empresa, mais de 18 mil foram demitidos, principalmente os que tinham posto de poder. Isso abriu mais uma crise no país. Depois do referendo revocatório que manteve Chávez na presidência, a oposição ligada as elites que governaram a Venezuela e entregaram suas riquezas, está promentendo puxar mais um referendo. Desta vez, será um ab-rogatório, que é o chamado para desfazer um lei, no caso, a do petróleo. A oposição vai insistir em voltar a ser como era antes, o petróleo nas mãos de uma burocracia sindical, de empresários nacionais, gerentes de multi e transnacionais. Ou seja, a riqueza do petróleo a serviço de poucos. Chávez, que é um defensor ferrenho da Constituição, não vai colocar obstáculos. Se o povo quiser votar, vai votar. Ele tem certeza de que a população da Venezuela vai querer que a riqueza petrolífera reverta em bens sociais, para todos, e não só para alguns.

Na verdade, na Venezuela, a queda de braço ainda não terminou. O petróleo é sua salvação, mas pode ser também a perdição. O mundo todo sabe bem o que aconteceu ao Iraque. Ter petróleo e estar no caminho dos interesses dos EUA é um risco. Hugo Chávez sabe disso e está disposto a correr o risco pelo bem do povo venezuelano. Caso venha mais um referendo, a população organizada vai saber dar a resposta certa.

* Jornalista no OLA